quinta-feira, 11 de março de 2010

Escutou alguns passos. Passara a noite acordado, esperando o sol. Era tarde. A porta não abrira. Conhecia todas as saídas, contudo, estava perdido. O calor da noite o havia enlouquecido. O pão mofado ao chão revelava que não fora apenas uma noite. Estava calado na cortina dos sonhos. Não avistaria o mar até a abertura da porta por quem roubara-lhe as chaves do olhar. Podia caminhar. Breves passos. Contidos em si mesmos. Girava no mesmo espaço. Voltas e voltas. Percebeu o olhar na solidão. Lá fora chovia. Sabia que a chuva dificultava os caminhos. Encharcava os olhos e a doçura da terra amarga. Escutou passos. Não acreditou na força do que escutava. Sorriu para si mesmo. Observou a noite interior do olhar. Não podia ver o sol, se fosse dia, e da noite, apartado estava da lua. Não sabia mais o que fazer além de enlouquecer. Na última tentativa de caminhar, encontrou ao chão uma trave. Dela se pegou. Da porta trancada, contra ela, lançou o madeiro. Era dia. A luz do sol o fizera perder a visão dos primeiros raios. Percebeu novos caminhos. No fim da caminhada, quando já exausto, encontrou um olhar. Sereno, dera-lhe respostas às perguntas que até então fizera. Respondeu todas. Um olhar. Caminhar já não era mais ato solitário: davam-se as mãos. Os remos já não eram únicos e o pequeno barco já não transportava a dor de um coração sangrando em dor. Carregava a verdade do encontro das mãos e olhares até então perdidos. Daí então, as pegadas fazem-se múltiplas, as partidas múltiplas...